Burel Factory. A História de uma Montanha
A Serra da Estrela surgiu como uma miragem num panorama debilitado pela crise que deixara fragilizada a região interior do país. Interviram. Na Burel Factory, hoje são mais de 100 pessoas, reavivaram uma Vila, uma fábrica e promoveram uma cultura que se julgava esquecida pelo tempo.
Corria o ano de 2006 quando Isabel Costa e João Tomás se deixaram libertar pela Serra da Estrela. As caminhadas exploratórias pela montanha tinham-lhes revelado um antigo sanatório nas Penhas Douradas lá no topo, que acabaram por adquirir, e que hoje é o hotel Casa das Penhas Douradas. Foi o início de um longo processo de recuperação de património que continua até hoje.
Na edificação da Casa das Penhas Douradas procurou-se ir ao encontro de elementos que evidenciassem a mestria na Serra, o burel, a lã e a sua ligação secular à cultura da região, altura em que encontram a fábrica da Lanifícios Império. A fábrica descobriu-os a eles e eles descobriram o burel que depois procuraram desenvolver, e que viria a ser utilizado na decoração do hotel. Foi aí que se apercebem que a fábrica se encontrava em processo de insolvência e sem capacidade de se adequar às necessidades que o tempo exigia, de um mundo que começava a girar demasiado depressa.
Decidem avançar com um processo de recuperação da fábrica e da sua aquisição para lhe continuar a narrativa que trazia desde o século passado e voltar a dar vida à população local que dela dependia. Para a mostrar ao mundo a sua arte. É hoje a Burel Factory.
Mantiveram as máquinas do século XIX, reciclam alguns padrões dos antigos livros de debuxo que ainda hoje utilizam em algumas mantas, e começam a dar cor ao burel que até à data só existia nas cores originais da lã. Mostram o produto a designers e a criativos. Procuram elevá-lo, valorizá-lo, e fazer com que se tornasse sinónimo de criação. Com que evidenciasse a inovação e todo o empenho no projeto.
Colocam os antigos mestres dos teares a ensinar os mais novos, de modo a incrementar a passagem de testemunho e não deixar morrer essa arte das mãos, não deixar que o som ancestral do bater dos teares deixasse de ecoar pelos vales daquelas montanhas. Assim se mantém até hoje.
Salvou-se assim um património industrial, uma tradição enraizada na vida daquelas fragas e asseguraram-se postos de trabalho e a transmissão do conhecimento dos ofícios da lã às novas gerações. Incrementou-se a sustentabilidade social, ecológica e conservação da montanha que é a sua casa, das pessoas que a habitam. Da natureza que os continua a inspirar. Da grandiosidade da paisagem que os acolhe. Das ovelhas que as percorrem e lhes emprestam a lã duas vezes por ano, dos pastores que as conduzem. Procuram atrair mão de obra qualificada para a região, difundir o talento e o carinho que se tece em cada peça. Promovem uma história que é de muitos e hoje são os maiores empregadores da Vila de Manteigas.
Em 2016 adquirem a antiga Pousada de São Lourenço para a transformar no novo hotel Casa de São Lourenço, que veio continuar a dinamização da região centro, e evidenciar um estilo de vida ligado à montanha, à sua cultura, à sua gente, e ao saber herdado por gerações.
No fundo são recuperadores de património, material e imaterial. É essa a sua missão. Sem passado não existe futuro. Querem valorizá-lo com inovação, que é o que realmente interessa.